Comida, sexo, cultura e os circuitos do prazer

Neste fim de semana, ao longo de 24h, a cidade de São Paulo esteve em festa. Centenas de atrações culturais para todos os gostos, balé clássico, dança moderna, rap, gastronomia, instalações e muita, muita  música. Os carros cederam lugar a uma maré de gente em busca de um bom espetáculo. Caminhar pelas ruas do centro, passando por pontos históricos como Pátio do Colégio, Vale do Anhangabaú, Teatro Municipal, Praça Roosevelt, Largo do Arouche, levava a uma verdadeira degustação cultural. Em meio a este burburinho, uma população permanecia  totalmente alheia, por toda a parte viam-se pessoas deitadas no chão frio, cobrindo-se com sujos e surrados cobertores. Penso que muitos participantes da Virada Cultural se perguntavam, o porquê desta gente não querer curtir a música, nem participar desta festa.

A tragédia das drogas que assola nossa sociedade certamente permite uma explicação. Algumas substâncias, como a cocaína, anfetaminas e, sem dúvida, o crack, ativam o sistema do prazer, cujo neurotransmissor responsável é a dopamina.

O prazer representa um sistema muito antigo que atua na motivação, trata-se da maneira que a natureza se certifica de que as condutas indispensáveis para a sobrevivência serão feitas, tais como comer e o sexo. Ao longo da evolução, este sistema de recompensa tornou-se um importante mecanismo de autopreservação da espécie.

Encontramos prazer de forma natural com condutas biológicas, mas também sociais, como conversar com um amigo ou uma boa festa, no entanto, ocorre que as drogas são muitíssimo mais poderosas do que as formas naturais, sabe-se que a cocaína, anfetaminas e o crack estimulam 10 vezes mais, além de provocarem mudanças físicas no sistema nervoso central causando a adição e, talvez, o pior, deixando o cérebro muito menos sensível aos estímulos cotidianos e comezinhos, por este motivo os dependentes perdem o interesse em todo tipo de atividade que não a própria droga.

Triste perceber que prazeres tão simples e sublimes, como ouvir música estejam tão distantes desta população doente a vagar por nossas ruas. Tema delicado, uma questão de saúde pública, que ainda está à espera de uma adequada resposta de nossa sociedade.

Autor: Verónica

Psicóloga, escritora, doutora em Sociologia. Professora e sempre aprendiz.

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